quarta-feira, 9 de setembro de 2020

ar

ainda ontem uma lagarta 
na ocasião de virar crisálida
me fez chorar
às vezes como ontem
penso em como tudo me emociona
o triste
o trivial
os detalhes...

as coisas aparentemente impenetráveis
me emocionam pela insistente resistência
de suas couraças

penso em tudo quanto é coisa 
que me emociona transbordando os olhos
e deixando a alma no aspecto sedoso
das pétalas...

um ninho
um desafino
um raio de sol que escapa no dia em o céu está encapado de nuvens

sinto-me por vezes
como um traço que saiu errado
porque a ideia quis que ele fosse lá
e o traço - sendo ele dono de si mesmo -
veio cá

por outras todas vezes
não me reconheço neste mundo
é como se tudo estivesse tanto
e eu sem fazer questão.
o sentido é coisa relativa
ora vem seguido de lógica
ora puramente coração.

eu sinto - através dos poros -
as asperezas das palavras e
o peso quase plumático do silêncio,
como estrelas que dormem
e mantém o brilho aceso.

voar pelos meus olhos
é desprender tudo que já esteve
já deu
passou
foi-se o tempo de ser em algo

estar em voo 
é estar em tempo de ser por si mesmo
a qualquer instante
pelo tempo que baste

não ver as coisas desta forma
é para mim ter na alma certa gravidade
que a deixa encostada no chão

eu por mim
fico com o ar

e com as asas




- Deboar Paixão

4 comentários:

Carlos Augusto disse...

Amiga, que bom que você fica com o ar; bom pra você e pra nós que gostamos de te ler!
Essa sua forma de olhar e se emocionar com as pequenas coisas da vida nos ajudam a ajustar o nosso olhar por aqui também. Obrigado por isso!

Paixão disse...

oh, meu amigo, num mundo difícil desse é tão bom contar com os bons e raros!
agradeço! <3

Patire disse...

Pois, traduziste tudo que há cá nos meu olhos, nos meus afetamentos.
Isso nos torna mais humanos ou mais frágeis apenas. Sei que sinto a dor da grama que podei, do medo da flor prestes a desprender-se.
Lindo poema!!! Lindo!!!

Paixão disse...

Também gosto muito desse! Acho que a sensibilidade por vezes se veste de fragilidade, mas ganha força na medida em que permite que possamos compreender melhor as coisas todas. A aproximação do estado puro de todas as coisas nos conecta a nossa humanidade e ser humano é ser um pouco de tudo que existe...