quarta-feira, 7 de setembro de 2016

Desapegar é preciso


Três vezes ao ano, aproximadamente, eu desapego das roupas que me cansam, que só ocupam espaço. Algumas roupas são mais fáceis. Outras parecem trazer consigo tanta história que acabo deixando pra próxima vez. E a próxima vez às vezes fica também para a próxima e nessa brincadeira, aquela história fica presa a mim por anos. Quero dizer, aquela roupa. Estou falando apenas de roupas. Quero que isso fique bem claro, porque pessoas a gente não descarta assim. Quero dizer histórias, não pessoas. Calma! Respira! 
Como que a gente faz pra se desfazer de algo que cuidamos tão bem e protegemos tão bem que sequer usamos? Deixamos lá tão bem guardadinhas as histórias. Roupas! Tão bem guardadas sem usar que o tempo vai lá e acaba usando. Amarelando. E as histórias vão perdendo as cores que tinham, os cheiros, a graça, o sentido. Aí acontece de a gente não lembrar mais o porquê de ter guardado tanta coisa por tanto tempo...
Não me servem mais, embora muitas ainda caibam. Mas serviriam a alguém? Afinal, continuam sendo roupas e como toda roupa, mesmo as velhas, estão sujeitas a ficarem mais bonitas, quando usadas por outra pessoa. Porque quem recebe uma roupa velha ou usada, recebe como nova em suas mãos e os seus olhos e seus sentidos voltam-se para aquela peça e enxergam uma possibilidade. Isso dá medo, não dá? Lidar com as inúmeras possibilidades alheias em algo que já não podemos insistir em manter, mesmo que em segredo. Me deu medo, mas deixei passar.
Hoje, peguei algumas peças e me despedi. Passei pra frente, passei da fase. Segui. Junto delas foram-se algumas histórias e pessoas, confesso. E estou estranhamente tranquila. Roupas novas se eu precisar, eu compro. Já as boas novas, as novas histórias e as boas pessoas a vida me traz de graça. E estas, graças a Deus, eu posso guardar para sempre.


Débora Paixão