terça-feira, 22 de dezembro de 2009

Sem tempo

O tempo escreve nosso destino usando caneta, não lápis. Se lápis fosse, apagaria metade. O corretivo não dá conta dos erros e erro maior é tentar corrigir as falhas que o tempo comete. Eu sigo apenas vivendo, um dia de cada vez. Um e o outro, o outro e o um. Não vejo erro algum no que faço agora, mas sempre que olho para trás vejo rasuras sobre o passado. Esperto esse tempo, pois não? Percebe os erros nas linhas, nas letras e nos parágrafos e cobre com riscos e rabiscos, tudo que escreveu às pressas, na falta dele mesmo talvez.
Débora Paixão

sexta-feira, 18 de dezembro de 2009

Frigidez Poética

"Quando escrevo
só espero enganar a mim,
mas vocês que lêem
tomam a frente
e vão tomando como verdade
as coisas que acreditam que sinto,
mas eu não sinto nada.
Tenho uma alma vazia,
pois nada em mim permanece,
tudo que chega voa pelos ares,
tudo fica disperso,
sentimentos reversos
pensamentos expressos, apenas.
Tudo que já escrevi
passou um dia por aqui,
mas dentro da minha cabeça.
As coisas que passam no coração
não cabe a mim explicar...
nem posso.
E eu não culpo ninguém por isso.
É uma condição.
Quando a gente lê se identifica,
acredita piamente naquilo.
Eu sempre caio nessas armadilhas,
até mesmo nas que eu mesma faço.
Não acredito em nada enquanto escrevo,
afinal não estou sentindo nada.
Apenas estou tomada pelas palavras...
(Como são poderosas!)
E ainda assim mantenho minha postura,
cética, enquanto estou escrevendo,
mas quando leio...
Ah, nessa hora,
eu começo a entrar em dúvida..."

Débora Paixão

terça-feira, 15 de dezembro de 2009

...

É triste sentir-se sozinho na multidão.
Encontrar-se cercado de estranhos
Que andam por caminhos vários
Todos sem rumo, sem direção.
E você lá, bem lá no meio deles
Andando a esmo, sem se importar
Com quem, com tempo, com lugar...
Sem ter com o que se preocupar,
Nem alguém que se preocupe
Se você está bem, se está doente...
Não há razão que se desculpe.
Sabe aquela solidão sentida diariamente,
Que cava lá no fundo, dentro da gente,
Criando um abismo tão profundo,
Que chega ao lado de fora dolorosamente,
Deixando-nos a sós com tudo que sobra,
Com todas aquelas coisas que nos resta?
Revela a busca pelo amor que não se aflora
Por viver um aniversário sem festa.
Ausente da presença de alguém que possa
Te libertar de tudo aquilo que o aprisiona...
De tudo aquilo que sempre vem à tona.
O medo, a vaidade, as velhas mágoas,
O orgulho, a saudade, os seus princípios...
Tudo aquilo que pela alma deságua
E contribui para o nosso isolamento
Das pessoas, do mundo, das cores
De tudo, e sobretudo, de nós mesmos.

Débora Paixão

sábado, 12 de dezembro de 2009

"Sobre o tempo" em 40 linhas ...



01. hoje o tempo está indeciso.
02. as nuvens passam tão rápido pelo céu...
03. ... que a luz que entra pela janela do meu quarto
04. parece coisa de discoteca
05. uma hora o vento entra com tudo
06. balançando a cortina
07. tirando as roupas do varal
08. e logo no minuto seguinte tudo está tranquilo
09. e o calor começa a incomodar demais
10. já até choveu por aqui hoje
11. e agora o sol está brilhando
12. vai entender esse tempo maluco
13. dizem que paulista gostar de falar do tempo
14. eu sou paulista
15. e estou falando do tempo
16. me enquadro então no modelo geral paulistano?
17. ui, que medo
18. agora está tudo escuro
19. e entrou um vento gelado demais no meu quarto
20. tem carros passando na rua
21. pessoas tirando um cochilo no sofá de casa
22. crianças andando de bicicleta
23. donas de casa fazendo doces, ou faxina
24. e nem parecem perceber as mudanças que estão acontecendo
25. talvez eu esteja só desocupada
26. e por isso dê importância a coisas que ninguém dá
27. mas como julgar a importância que as coisas tem para as pessoas?
28. é tudo relativo
29. agora o sol está brilhando de novo
30. e o tempo está tão abafado que sinto falta de ar
31. pelo menos o vento sossegou
32. o sol que as vezes aparece
33. secou todas as pistas no chão de que havia chovido
34. olha a nuvem de novo
35. mas pq eu me importo tanto com isso?
36. acho que é pq parece que meu coração tá mudando junto
37. é estranho, bem estranho
38. mas ao mesmo tempo esclarecedor
39. consigo ver tudo que acontece aqui dentro
40. passando do lado de fora ...

Débora Paixão

quarta-feira, 9 de dezembro de 2009

Sobre "Caixa de Fósforos"


Dentro da caixa de fósforos,
Há um palito impaciente
Que não consegue dormir,
Pensando receosamente,
Na forma em que deseja partir.
Ideias revolucionárias,
De quem não pode fugir do destino,
Tomam conta do seu pensamento,
E com pesar ele fica contando
Inúmeras mortes ao mesmo tempo.
Se é para morrer mesmo,
Se já não há mais o que fazer,
Que seja ao menos uma morte digna
De causa que valha a pena morrer.
Morrer por morrer não compensa.
Que eu morra para ser lembrado!
Por aquele que dorme e sonha
Ou por quem fica sonhando acordado.
A suplica é que não haja vento
Para anteceder o ritual da morte.
Senão de que valeria isso tudo?
Cabeça quente, pé-frio, sem sorte.
Se eu morrer só pela metade
E antes de morrer eu visse
Que nem a morte pôde me salvar
Da minha própria vida vazia;
Sem luz, sem iluminar...
Desejaria morrer de novo
Só para sentir o fogo queimar.
Débora Paixão

domingo, 6 de dezembro de 2009

Um historinha melosa, cheia de frases clichês.

Naquele momento ela pensava que não poderia existir no mundo uma sensação pior que aquela e disse:

- Eu não posso perdoá-lo. (Mas no fundo ela queria sim.)

Ele sabia que tinha errado, e tentou corrigir utilizando argumentos que para ele mesmo eram desonestos demais para serem considerados válidos e ele sentia que não merecia de fato, aquele perdão, mas ainda assim tentou consertar o mal que havia feito:

- Você sabe que eu te amo e não poderia magoá-la intencionalmente. O que eu fiz foi sem pensar.
- Por favor não insista. Não vê que isso dificulta ainda mais as coisas?
- Você também gosta de mim, dá pra sentir essas coisas. Eu sei como você se sente quando eu te toco, quando eu beijo você...eu vejo como você fica quando me ouve dizer que te amo mais que qualquer coisa no mundo...
- Também não é assim, eu poderia muito bem sobreviver sem isso tudo. Eu vivia muito bem antes de te conhecer e na verdade, depois de me envolver contigo só tive dor de cabeça. Não posso ficar com alguém que faz mal para mim. Você sabe que faz ... (Na verdade, ela só estava sendo durona. Ela não queria parecer fraca. Não, ela não era. Na cabeça dela ela não podia ser.)


Agora ele estava realmente arrependido, pois percebeu que ela era tudo que ele tinha. Ele sim era fraco demais para viver sem ela. Estaria perdido no mundo. Ela o mantinha em equilíbrio. O preço a pagar por um erro, as vezes é caro demais, e mesmo assim tem vezes que insistimos em errar. Pior é que na maioria das vezes, a gente pensa sim, entretanto damos mais atenção a emoção do presente do que o valor do passado ou a estabilidade do futuro. Não dá para conviver com peso na consciência. A gente se liberta de vícios, mas a dor de um erro nos aprisiona. Só ela conseguia fazer com que ele se acalmasse quando seu único desejo era que o mundo todo explodisse, e para isso bastava apenas um simples: Amor, não fica assim, você sabe que vai passar... acompanhado de um beijinho no pescoço ou no canto da boca. Mas ele era, sobretudo fraco demais. Não podia dizer essas coisas. Era estranho pensar em si mesmo como uma criatura tão dependente. Mas não era hora de ser egoísta, embora tenha sentido uma tremenda vontade de chorar disse:

- Me perdoa, amor! Você tem razão. Eu não sou bom o bastante para você.

Foi tudo que pode dizer naquele momento. Ela sentiu uma vontade enorme de abraçá-lo, mais do que em qualquer outro momento na sua vida, mas só pode dizer:

- Eu sei, e é por isso que acabou! Ou está acabando...tente não me procurar, vai ser mais fácil para esquecê-lo. Eu te amei e neste momento grande parte de mim ainda te ama, mas ela luta com uma outra parte que está sofrendo demais com isso tudo e prefere acabar logo com isso, essa outra é mais forte. (Tem que ser)

Embora ele soubesse que suas palavras poderiam receber essas respostas, não estava preparado para ouvi-las. Então ele se aproximou para beijar sua face, pela última vez e ela recuou, ainda querendo grudar selvagemente nos seus lábios, tomada por um desejo que gritava dolorosamente. Levantou e foi embora, sem dizer mais nenhuma palavra e segurou o choro.

Ele ficou sentado ali, embaixo da árvore, pois notou que não tinha força para levantar...e permaneceu ali por algumas horas sentindo o cheiro da grama molhada, iluminado por uma dúzia de estrelas no céu...



Débora Paixão

quinta-feira, 3 de dezembro de 2009

tempos passados passaram

não basta ajustar o relógio
para a hora que eu quiser
um botão não será capaz
independe do que eu fizer
de me fazer reviver por um dia
os tempos que se perderam
desde mil e novecentos
de janeiros a janeiros
entre as folhas de caléndário
e aqueles malditos ponteiros
Débora Paixão

Loucura sã

"Que a dúvida
Esteja certa
De que não estou
E nem quero
Querer estar
Nem perto.
A loucura compreende
Os delírios
E os desejos
Da sanidade,
Que persegue
Laços de afeto.
Como fossem contratos
Beijos e amores
Concretos.
Do sabor amargo
Da paixão,
O doce, excreto."
Débora Paixão

terça-feira, 1 de dezembro de 2009

Antes que doa mais

"ando meio doente
dói a vista, dói o dente
dói tudo ultimamente
coisas que doem
dentro da gente

viver assim é deprimente
quem vive, chora
quem chora, mente
evita a lágrima indecente

quanto à dor física
que desta eu me ausente
já a dor psíquica
aquela que vai na mente
que esta se esconda
permanentemente
pois a dor em si já basta
e isso fica evidente
trazê-la de volta a lembrança
seria sofrer novamente"

Débora Paixão