quarta-feira, 15 de outubro de 2014

Apenas


Amor
Às vezes cabe na gente
Outras transborda
E se espalha 

Medo
Às vezes ajuda gente
Quando se vai
E não atrapalha

Amor e medo
Não combinam
Onde um mora 
O outro se manda
Um fica 
O outro cai fora

Se escolhe o medo
O amor encolhe
E corre

Se o amor te ganha
Você escolhe:
Ou transcende 
Ou morre.

Morrer de amor
É uma morte
Que vale a pena

Morre tudo
Que não o é
E fica sobrando
Amor, apenas.

Débora Paixão 

domingo, 27 de julho de 2014

Quando

Quando a última folha cair
E o mundo parecer desabar
Quando uma lágrima queimar seu rosto
Quando a barriga doer de tanto rir
Quando acabar a água, a luz ou gás
E quando nascer o sol ou brotar a flor
Quando espetar o espinho
Quando a chuva cair
E inundar a cidade
Quando romper o império
E morrer o último papa
Quando descobrirem a cura pra AIDS
Ou para saudade
Quando os anjos descerem
E disserem amém
Quando o bebê nascer gargalhando
Quando o dente de leão assoprado pela criança sair voando sobre o pasto
E os cavalos marcharem um tango argentino
Quando todos os absurdos
E principalmente os possíveis
Acontecerem, cada um, em seu tempo
É a sua mão que quero segurar
E se soltar sua mão de repente
Ainda assim, sentirei o calor do seu sangue
Como quem acredita ser eterno enquanto dure
E ainda que vá embora
Ou que nada disso aconteça
Minha mão estará sempre na sua
E também a minha vida
Como sempre esteve.

Débora Paixão

domingo, 15 de junho de 2014

Naquele dia que você me olhou diferente

Naquele dia que você me olhou,
Você me olhou diferente.
Olhou por mais tempo,
Olhou mais para dentro.
Olhou e viu algo mais.
Olhou e desviou o olhar.
Mas antes que desviasse,
Eu pude, naquele dia,
Decorar seu movimento.
Pude ver algo mais,
Pude congelar o tempo,
Pude olhar além de dentro.
Naquele dia alguma coisa mudou...
Não sei ao certo!
Não sei se o ar...
Não sei se o tempo...
Mas algo mudou estranhamente.
No dia em que você me olhou, você me viu!
E eu me vi em seus olhos
Quando pairavam sobre os meus.
Já os meus olhos pelos teus,
Desde o dia em que olhou,
Vêem tudo diferente.
Vêem tudo mais que estranho!
Tudo que era então distante
Nunca que era suficiente,
Mais pro lado do bastante,
Se aquietam - agora - os olhos
O coração e a mente.



(Débora Paixão)

terça-feira, 11 de março de 2014

Quem sabe a chuva?



Joana queria sair com Pedro. Conversavam pelo celular. Eram vizinhos. Acontece que a chuva não esperou pra cair e não passou pela cabeça de nenhum deles tomar um banho de chuva na rua.
No outro canto da cidade, Renato agradecia a chuva, gota a gota, pois era a desculpa que precisava para desmarcar o compromisso com alguém que lhe quer muito bem e esperava há anos por isso. Renato diz a si mesmo que não foi por maldade, era apenas preguiça. E assim, Renato pode dormir 12 horas ao invés de 8.
Sebastiana que estava na rua só conseguia pensar na roupa que estava no varal. Rodrigo, no carro que acabara de ser lavado. Bárbara, no dinheiro gasto em vão no cabeleireiro. Sofia que não poderá usar a roupa que queria na festa, chorou.
Seu Luis, que era sabido da vida, com seus quase 90 anos, estava fazendo pipoca para assistir a um filme sozinho, mas quando ouviu a chuva foi caminhando lentamente até a janela. Vez ou outra colocava a mão para fora, para sentir como é gelada. Voltou à cozinha, pegou um copo de alumínio e colocou-o delicadamente no parapeito da janela para ver quantas gotas queriam entrar ali. Achou engraçado o som da gota no alumínio e sorriu. Lembrou-se de quando era criança. Sentiu o cheiro da pipoca queimando, e desligou o fogo. Decidiu que a chuva era o filme mais bonito. De repente, percebeu que havia perdido a conta das gotas e se deu conta de que todas, afinal se tornaram uma só. Ficou feliz por entender isso e se sentiu agradecido. Olhou o chão molhado, notou que a essa altura do tempo, sua camisa também molhara, bem como o rosto e os ralos cabelos brancos. Não quis se trocar, nem secar o chão, pois achou bonito e quis observar quanto tempo levaria para que aquelas gotas secassem sozinhas. Seu Luis, aos quase 90 anos, perdeu a noção do tempo. E agradeceu por isso também. A essa altura, achara tudo muito poético, tanto, que seus olhos gotejaram. Seu Luis, sorriu e chorou com a chuva.
Sofia, ainda que tivesse visto a cena, talvez não fosse capaz de entender o que se passou; os outros provavelmente também não veriam sentido. Quem sabe na próxima chuva? Uma pena que só Seu Luis tenha sentido nesta história.

- Débora Paixão



sexta-feira, 17 de janeiro de 2014

Olhos de Gota





















Qualquer coisa que dissesse
Bastava! Um segundo,
E me ganhava
Os olhos, as mãos
O coração e toda alma
Os dias duros, amaciava
Com um sorriso
Em dias como ontem
Como os próximos
E como hoje
É isso o tudo que preciso.
Pergunto a Deus
Como é que pode
Passar dias, meses, anos
E o amor não achar fim?
Como é que pode
Tão pequena criatura
Ter tão grande poder assim?
Como é que pode, Deus,
Amor tão grande como esse
Achar jeito de caber
Aqui dentro de mim?"


à Alice, sobrinha e afilhada,
com amor,
Titia Bébi

( Débora Paixão)